Um grupo de procuradores municipais de Curitiba desistiu de participar do Congresso Nacional da categoria por causa da presença do juiz federal Sérgio Moro na abertura do evento, ontem terça feira (21). Quando o nome do magistrado foi confirmado, 72 procuradores municipais assinaram uma nota endereçada ao presidente da Associação Nacional dos Procuradores Municipais (ANPM), Carlos Mourão, para manifestar a insatisfação do grupo.
O grupo de procuradores que organizou o protesto contra o juiz deixou o local quando Moro iniciou a palestra. O magistrado foi o último palestrante da noite.
Cerca de 25 procuradores municipais endossaram a manifestação, mas permaneceram no Congresso para protestar contra a presença do magistrado. A ideia inicial do grupo era fazer um protesto silencioso durante o congresso. Mas segundo o procurador municipal de Fortaleza e ex-presidente da ANPM, Guilherme Rodrigues, três faixas trazidas pelo grupo foram tomadas pela organização.
“A ideia não era ter vaia, não era ter protesto barulhento. A ideia levantar uma faixa e nos retirarmos exatamente por não concordar com esse convite”, disse. “Nós tivemos as faixas apreendidas e, por isso, não nos restou outra solução a não ser expressar com a voz o que a gente ia expressar com as faixas”.
Em meio a aplausos de participantes que ficaram em pé para saudar Moro, na plateia, também era possível ouvir algumas vaias e gritos de ‘vergonha’ quando o nome do juiz era mencionado.
Segundo Guilherme Rodrigues, houve um movimento orquestrado da organização para impedir vozes dissonantes.
“Se não podia mais desconvidar um juiz que é um juiz polêmico, que dividiu a categoria, se não meio a meio, que trouxe insatisfação, nós pedimos para que fizessem um contraponto. Ouvisse uma opinião do mesmo tema, com uma outra visão. Nós sugerimos, inclusive, o ex-ministro da Justiça, Eugênio Aragão. Para nós, a negativa do convite nos deu a certeza de que aqui foi armado um palco que na verdade não é de combate a corrupção”, afirma. “Não se combate a corrupção combatendo direitos fundamentais”.
Para a procuradora municipal de Fortaleza Rosaura Brito Bastos, Moro exerce uma magistratura acusatória, que desrespeita os advogados e a defesa dos réus. “A ele, ao juiz da causa, que deveria ser imparcial, só servem as provas que venham a contribuir com a tese dele, que é acusatória. Um juiz não pode ser acusador”.
“Quando ele age dessa forma, ele desrespeita o trabalho dos advogados. Não existe hierarquia, não existe uma superioridade. Não se admite que um juiz mande um advogado calar e boca e mande ele fazer concurso para juiz. Nós não queremos ser juízes, nós queremos ser advogados”, afirma.
Em sua palestra, ao relatar episódios descobertos na Lava Jato, Sérgio Moro disse que a corrupção é um comportamento desviante, que pode ocorrer em qualquer lugar. Moro citou o caso do Rio de Janeiro como um exemplo.
“É possível cogitar a possibilidade, e isso é algo um tanto quanto aterrador, de que esquemas criminosos semelhantes se reproduzam em outras esferas – estadual, municipal, em vários países e vários locais dessa nação. O exemplo mais visível atualmente talvez seja o estado do Rio de Janeiro, onde, puxando o fio de uma investigação originada de corrução em contratos da Petrobras, se identificou um esquema criminoso muito mais complexo a abrangente”.
O juiz também diz ser necessária vontade política para combater a corrupção sistêmica, da mesma forma com que o Brasil conseguiu promover outras mudanças estruturais nos últimos anos.
“É inegável que, nas últimas décadas, houve avanço significativo em relação ao enfrentamento da desigualdade, pobreza no Brasil, com programas relevantes de transferência de renda, programas de cotas nas universidades públicas. Tudo isso revela que não existe problema invencível desde que haja vontade política”, disse.
Além de Moro, o arquiteto e urbanista Jaime Lerner apresentou palestra na abertura do Congresso Nacional dos Procuradores Municipais. O evento será encerrado na sexta-feira (24), com as palestras do ministro do Superior Tribunal de Justiça Joel Paciornik e do procurador do município de São Paulo e ex-ministro da Justiça Eduardo Cardozo.