Maranhense discursa na ONU, é homenageada em Nova Iorque e faz convocação para a “maior mobilização indígena do mundo”, que acontece esta semana em Brasília.
Pela primeira vez em 15 anos o Acampamento Terra Livre, ato político de indígenas brasileiros em Brasília, acontecerá em um momento de tensão. Na última semana Jair Bolsonaro (PSL) chamou a reunião de anual de “encontrão” pago pelo contribuinte, enquanto o Ministro Sérgio Moro convocou a Força Nacional para atuar na Esplanada dos Ministérios e da Praça dos Três Poderes em período coincidente ao evento, programado para os dias 24, 25 e 26 de abril.
“Nós queremos o melhor para o índio brasileiro, que é tão ser humano quanto qualquer um que está aqui na frente de vocês agora. Mas essa farra vai deixar de existir no nosso governo”, disse o presidente em um vídeo ao vivo nas redes sociais.
Uma das principais lideranças indígenas, a maranhense Sonia Guajajara foi direta ao pontuar os equívocos e a falta de conhecimento do presidente. “É a primeira vez que ocorre comportamento antecipado de tentar impedir a chegada das delegações. [O decreto de Moro] É uma forma clara de impedir uma manifestação. Nós nunca tivemos financiamento com dinheiro público ou apoio de governo federal. Em todos os anos, fazemos uma campanha de arrecadação para promover o encontro e instalar o acampamento”, disse Sonia à Folha de SP.
A APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), do qual Sonora é coordenadora-executiva, divulgou nota criticando a atitude do governo. “Seguindo a intenção de exterminar os povos indígenas do Brasil, o governo Jair Bolsonaro intensifica sua posição de quando ainda era parlamentar, quando afirmou em 15 de abril de 1998, que ‘a cavalaria brasileira foi muito incompetente. Competente, sim, foi a cavalaria norte-americana, que dizimou seus índios no passado e hoje em dia não tem esse problema em seu país’”.
“Parem de incitar o povo contra nós! Não somos violentos, violento é atacar o direito sagrado a livre manifestação com tropas armadas, o direito de ir e vir de tantas brasileiras e brasileiros que andaram e andam por essas terras desde muito antes de 1500”, diz o texto da APIB.
A imprensa paulista afirmou que a expectativa do encontro é reunir entre 4.000 e 5.000 indígenas, mas alguns veículos de comunicação já falam em dez mil pessoas. Nas redes sociais, lideranças como a própria Sonia publicaram convocações afirmando que esperam realizar “a maior mobilização indígena do mundo”.
Os participantes começam a chegar em Brasília na noite de terça-feira (23) e permanecem até sexta-feira (26). Uma vaquinha virtual lançada pela APIB já tinha conseguido arrecadar R$ 75 mil até a publicação desta reportagem.
“Nós pretendemos instalar o acampamento na Esplanada dos Ministérios mesmo, porque não há motivo de a gente se esconder, já que são eles quem estão nos ameaçando”, afirma Sonia.
O propósito do encontro é fortalecer a resistência indígena e articular estratégias de luta em defesa da identidade dos povos originários e em defesa da Amazônia. O movimento também critica as mudanças implementadas pelo Governo Bolsonaro, como a transferência da Funai, que saiu do Ministério da Justiça e foi para a de Direitos Humanos, que tem Damares Alvez como ministra, e que o setor responsável pela demarcação de terras indígenas não seka o ministério da Agricultura, historicamente ligado ao setor do agronegócio.
A mobilização também é contrária ao fim da Secretaria Especial de Saúde Indígena. “Eles dizem que temos de ser integrados para sermos cidadãos, mas não pedimos isso”, declarou Sonia.
A Revista Época divulgou informação de que Caetano Veloso organizou um jantar em Nova Iorque para homenagear Sonia, que discursou na ONU sobre os riscos que visões do governo Bolsonaro representam para os indígenas brasileiros.
O jornal New York TEMPOs, em longa entrevista com Sonia, pontuou que “embora há muito tempo em perigo, a floresta está sob maior ameaça agora sob a presidência de Jair Bolsonaro, um líder populista polarizador nos moldes do presidente Trump”, que “agiu rapidamente para minar as proteções ao meio ambiente, aos direitos indígenas à terra, às organizações não-governamentais e basicamente a qualquer um que discordasse dele”.
Para a repórter Carol Gioacomo, que assina o texto, “se há esperança para a Floresta Amazônica e para países onde as autoridades ameaçam a democracia e as agendas progressistas, ela vive na determinação e poder de ativistas da sociedade civil como Sonia Guajajara”.