A ridícula sentença do juiz alagoano Carlos Bruno de Oliveira Ramos, da 4ª Vara Cível de Arapiraca (AL), cujo efeito prático seria nulo, não sobreviveu a uma semana de exposição. Tornada pública no dia 9 passado a partir da citação da Universidade Estadual de Alagoas (UEAL), a decisão foi anulada nesta quarta-feira (14/10) por iniciativa do seu autor.
Embora ele não admita, certamente o fez por conta das críticas recebidas. E também pela evidência do desleixo com que enfrentou o caso que, em três anos de tramitação, permaneceu parado na Vara por mais de 30 meses. Em todo este período, porém, ninguém ali, a começar pelo próprio juiz, foi capaz de perceber a ilegalidade da ação, agora invocada para justificar sua mudança de posição.
Com a desculpa de que a publicação da decisão anterior “foi liberada nos autos digitais de forma inadequada, possivelmente por algum comando dado no sistema, de forma não voluntária, uma vez que a minuta ainda em edição estava na fila de processos em elaboração e acabou sendo finalizada juntamente com outras decisões corrigidas no mesmo dia”, o juiz decidiu chamar o feito à ordem “para tornar sem efeito a sentença de págs. 96/97”.
Trata-se de uma desculpa que soa “esfarrapada”. Afinal, assinada em 23 de julho passado é inacreditável que o juiz e seus auxiliares demorassem mais de 80 dias até perceberem o erro provocado “por algum comando dado no sistema” que levou à publicação de uma sentença errada. Ao anular a decisão criticada por todos e apelar para uma desculpa que soa esfarrapada, o magistrado acabou confirmando o que noticiamos aqui na manhã desta quarta-feira (14/10) – – Sentença ridícula contra Lula revela desleixo do juízo.
Ao tentar anular a comenda dada ao ex-presidente Lula com uma sentença inócua, Oliveira Ramos acabou por atrair a atenção para a Ação Popular nº: 0704999-51.2017.8.02.0058 e, com isso, tornou visível a maneira desleixada como o processo circulou na Vara que comanda. Agiu de forma tão desleixada que não percebeu antes a prescrição do prazo legal para a apresentação da Ação, argumento agora utilizado para, na prática, extinguir o feito sem qualquer decisão.
Ação ilegal tramitou por três anos
Ou seja, por mais de três anos – de 21 de agosto de 2017 até os dias atuais – o processo tramitou pela sua vara (e pelas suas mãos ) reclamando de uma premiação outorgada em 20 de março de 2012, sem que ninguém percebesse que a causa foi apresentada “fora do prazo prescricional de 5 (cinco) anos para a propositura da ação popular, previsto no art. 21 da Lei nº. 4.717/65”, tal como agora fez constar na nova decisão. Uma confissão pura, simples e direta do desleixo na apreciação do caso.
Não bastasse essa demora para perceber a ilegalidade da ação, demorou ainda 77 dias para intimar as partes – a UEAL e Lula – da decisão assinada em 23 de julho. Cinco dias depois de intimá-las, descobriu que a sentença apresentada não era a definitiva, mas sim uma que “ainda estava em construção”, como expos na nova decisão.
Oficialmente, a decisão de hoje apaga a sentença que deu em julho declarando a “nulidade do ato administrativo que condecorou o Sr. Luiz Inácio Lula da Silva, em 23 de agosto de 2017” com o título de Doutor “Honoris Causa” da Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL)”.
Na realidade, o seu ato desta quarta-feira apenas extinguiu uma “sentença ridícula” que, como mostramos na reportagem citada acima, jamais teria qualquer efeito prático.
Afinal, a premiação conferida por um colegiado de acadêmicos jamais perderia a validade real, a não ser por iniciativa daqueles que a concederam em março de 2012, os membros do Conselho Superior da UNEAL.
Mesmo que a sentença não fosse anulada ou modificada pela instância superior, o fato real é que houve uma proposta de premiar Lula, ela foi devidamente debatida entre os membros do Conselho – todos, acadêmicos -, tudo no bojo de um processo administrativo legal e, ao final, votada e conferida. Ainda que fosse possível a um juiz anular tal procedimento, a premiação jamais perderia seu efeito prático, a de que um conjunto de acadêmicos reconheceram a necessidade de premiar um ex-presidente.
Caso acentua a perseguição judicial a Lula
Ao decidir anular o título concedido, o juiz sequer levou em consideração os argumentos apresentados no processo tanto pela defesa de Lula, a cargo do escritório Teixeira Martins Advogados, como pelo procurador que falou em nome da UEAL, Sérgio Ricardo Vieira Leite. Ambos defenderam a autonomia da universidade para conceder o prêmio e rebateram qualquer tese da ilegalidade do ato.
Também o Ministério Público, através do promotor Rogério Paranhos Gonçalves, sustentou o óbvio: a necessidade de extinção da ação por perda de objeto. Afinal, como também reportamos, a própria autora do pedido, a advogada Maria Tavares Ferro – que em 2018 tentou se eleger deputada federal, sem sucesso, pelo partido Novo – já havia desistido da ação, ainda que jamais tivesse formalizada tal desistência
Na prática, depois de ingressar com a ação popular em agosto de 2017, nunca mais voltou a se manifestar nos autos. Permaneceu em silêncio mesmo depois de intimada várias vezes pelo juízo. Ou seja, abandonou o caso.
Mas o pior é que, como o próprio juiz teve que reconhecer, a decisão de julho, por erro de comando ou não, jamais deveria ter sido dada. Afinal, a impetração da ação ocorreu fora do prazo legal. Na realidade, portanto, o processo nem deveria ter prosseguido. Gastou-se tempo e ocupou-se os servidores do judiciário com uma ação que se iniciou ilegal, com prazo prescrito. Provavelmente apenas por conta do nome que consta na capa do processo: Lula.
Trata-se de mais um episódio que acentua, de forma clara, a perseguição de determinados setores do judiciário ao ex-presidente. Episódio com nítidas conotações políticas. Principalmente quando se leva em consideração que a autora do processo tinha interesses eleitoreiros. No ano seguinte em que tentou barrar a solenidade de entrega do título ao ex-presidente, candidatou-se.
Como alerta o advogado Cristiano Zanin, defensor de Lula, este episódio, ainda que superado, não pode deixar de ser visto como inserido no “permanente lawfare” a que ex-presidente sofre desde que iniciada a perseguição judicial por Sérgio Moro e a Força Tarefa da Lava Jato, em Curitiba. Uma perseguição continuada, que reverbera na cabeça de determinados juízes.
“A nova decisão restabelece a justiça neste caso para Lula e é a única compatível com o princípio da autonomia universitária, que concedeu o título honorífico ao ex-presidente por meio do órgão competente. De qualquer forma, a superação de uma decisão ilegal contra Lula não pode ofuscar o cenário de permanente lawfare enfrentado pelo ex-presidente nos últimos anos”, afirma Zanin.