Há pelo menos dois meses, sabe-se que o ex-advogado da Odebrecht reuniu em um livro várias acusações contra a Lava Jato. Particularmente, no que diz respeito a interferências nas negociações entre Estado e réu. Os rumores de que ele poderia colocar em xeque a reputação de Moro e de toda a operação se concretizaram na manhã de 30 de novembro de 2017.
Acusações
Durante três horas e cinquenta e minutos, Tacla Durán prestou depoimento via teleconferência para a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga desvios na atuação da empresa JBS. Porém, dedicou a maior parte do tempo para tratar de outro assunto: os subterrâneos de uma delação premiada na Lava Jato.
O ex-advogado da Odebrecht relatou que não fez acordo de delação porque considerou que estava sendo extorquido durante as negociações. Segundo um anexo de 45 páginas entregue por Durán ao final do depoimento, a extorsão teria sido realizada por outro advogado, Carlos Zucolotto Jr., profissional que lhe foi indicado para vender certas “facilidades” no acordo.
Carlos Zucolotto é padrinho de casamento do juiz Sérgio Moro e foi sócio da esposa dele, Rosângela Moro, em um escritório de advocacia.
Durán apresentou cópias de conversas por celular em que Zucolotto admite estar intermediando as condições do acordo de delação com “DD”. Embora essas sejam as iniciais de Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa da operação, o ex-advogado da Odebrecht não fez nenhum tipo de suposição no depoimento: apenas pediu que Zucolotto seja chamado a esclarecer a quem se referiu naquelas conversas.
Conforme a versão de Tacla Durán, o padrinho de casamento de Moro tinha o poder de negociar propostas favoráveis aos delatores da Lava Jato junto ao Ministério Público. No caso dele, as conversas por celular mostram que Zucolotto teria conseguido diminuir a multa paga ao final do acordo de 15 para 5 milhões de dólares, mediante o pagamento de outros 5 milhões em propina – no diálogo, ele se refere à propina como “honorários”.
Perícia
O juiz federal Sérgio Moro se pronunciou sobre o caso em 27 de agosto de 2017, assim que vazaram as primeiras informações do livro de Tacla Durán e o caso foi parar na coluna da jornalista Mônica Bérgamo, do jornal Folha de S. Paulo. Moro foi questionado pelo jornal Brasil 247 sobre as supostas denúncias, e enviou uma nota à imprensa para tentar desmentir as acusações.
Sérgio Moro alega que Zucolotto é um advogado “sério e competente”, e que o rumor de que ele teria intermediado um acordo de delação é “absolutamente falso”. O magistrado acrescentou que Durán não havia apresentado, até aquele momento, nenhuma prova ou fonte de suas afirmações.
Após o depoimento do último dia 30, o cenário mudou: além de apresentar cópias dos diálogos com Zucolotto, o ex-advogado da Odebrecht submeteu as imagens a perícia.
O trabalho foi feito pela Associação Espanhola de Peritos, que sorteou o perito judicial Castor Iglesias Sanzo para aquela tarefa.
De acordo com a perícia, as mensagens foram enviadas através de um aparelho Samsung SM-G800H nos dias 24 e 25 de maio de 2016. “Tanto as imagens como as datas de captura não foram modificadas ou alteradas em seu contexto geral ou específico. Este é o meu relatório que contém 8 páginas e que registro, prometendo dizer a verdade, ao meu melhor conhecimento e convicção, agindo com a maior objetividade, levando em consideração que posso favorecer ou prejudicando qualquer das partes, sabendo as sanções penais previstas pela infração do meu dever como especialista, acreditando cumprir a ordem determinada os efeitos que prosseguem”, concluiu Sanzo, no laudo pericial do dia 3 de novembro de 2017.
Mesmo antes das provas serem submetidas a perícia, o advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, conhecido como “Kakay”, havia afirmado à imprensa que a ação de Zucolotto poderia ser interpretada como crime de obstrução de Justiça, “com prisão preventiva decretada”.
Se comprovada, a hipótese de pagamento de propina para um amigo pessoal de Moro negociar facilidades nos acordos de delação é suficiente para desmoralizar toda a Lava Jato. Afinal, as delações premiadas são o pilar que sustenta a operação há quase quatro anos e configuram a principal fonte de indícios para prisões e denúncias desde então.